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Reforma Tributária já começou nos bastidores

André Buttini de Moraes

Com homologações técnicas em curso, o tempo para adequação está acabando.

Faltam poucos meses para a entrada em produção das novas obrigações fiscais decorrentes da reforma tributária. A liberação dos ambientes de homologação para os novos layouts da NF-e e da NFS-e nacional, formalizada nas notas técnicas de junho de 2025, confirma que o processo já deixou de ser conceitual. O movimento agora é técnico, com impactos operacionais em andamento dentro de muitas empresas. Ainda que o calendário aponte para janeiro de 2026, o tempo para uma reação está cada vez menor.

O novo modelo de dados, já em fase de validação, afeta diretamente os sistemas legados, a lógica de emissão, os cadastros internos e a interoperabilidade entre plataformas. Tratar essa virada como algo futuro é ignorar que a transformação já começou e ela começou no XML.

No centro dessa mudança está o ERP. Muito mais do que um repositório fiscal, ele se consolida como o principal vetor de aderência ao novo modelo. É por meio dele que os dados transacionais são estruturados, interpretados e transmitidos. E é sobre esses dados que o Fisco intensificará os cruzamentos. A lógica por trás da reforma vai além da arrecadação. Ela é informacional. Seu funcionamento pleno depende da consistência, granularidade e rastreabilidade das informações como base de um novo paradigma regulatório.

A homologação em curso representa, por definição, uma fase de transição. Empresas que ainda aguardam novos desdobramentos para iniciar suas adaptações correm o risco de transformar cautela em passivo. Decisões que não foram tomadas até agora terão de ser executadas com menos tempo para planejamento, testes e correções. Isso eleva os custos e compromete a previsibilidade na virada oficial.

As notas técnicas já disponibilizaram o novo layout dos documentos fiscais em ambiente de homologação. O modelo de dados foi reformulado, novas regras de validação entraram em vigor, códigos
fiscais foram definidos e campos relacionados à CBS e ao IBS já estão sendo testados. A estrutura está posta. E quem ainda não iniciou os ajustes corre o risco de enfrentar rupturas operacionais no momento mais sensível do calendário.

O ciclo de adaptação vai além da simples atualização de sistemas. Envolve redesenho de processos, revisão de integrações com fornecedores, reparametrização de regras fiscais, adequação de cadastros, simulações de impacto financeiro e testes em diferentes ambientes. Na prática, trata-se de uma reconfiguração estrutural da espinha dorsal tributária. E como toda transformação, demanda tempo, método e decisões que não podem ser empurradas para o último trimestre do ano.

Mesmo após janeiro de 2026, a transição continuará. Alíquotas, regimes e aspectos federativos ainda estarão em ajustes. Mas o que está em curso agora é a fundação técnica, o momento em que o país precisará sincronizar sistemas, vocabulários e lógicas fiscais. Aguardar definições finais pode parecer prudente, mas, na prática, significa perder tempo estratégico e comprometer a fluidez do processo de adaptação.

O mercado já viveu transformações semelhantes. A introdução da NF-e, o SPED, o Reinf, a DCTFWeb. Cada etapa veio acompanhada por um período de transição que penalizou empresas mais reativas. A diferença agora está na profundidade. Não se trata de mais uma obrigação acessória, mas de um novo modelo de tributação concebido para ser digital desde a origem.

Por isso, talvez a pergunta mais relevante neste momento não seja quando a reforma entrará em vigor, mas sim em que estágio cada organização está para operar em um ambiente fiscal orientado por dados. Um modelo que não admite improviso, que exige consistência sistêmica e que transforma o ERP em pilar da maturidade tributária.

Janeiro pode ser o prazo legal. Mas a janela de adaptação já está aberta. E o tempo técnico, este sim, está se esgotando.